sexta-feira, 9 de agosto de 2013

A essência do homem

Sabemos que o homem, na aparência, é aquilo que os cientistas dizem que ele é: um organismo vivo com algumas necessidades e desejos. Esses cientistas nos informam que, quanto às necessidades, elas se impõem por sua condição natural e, quanto aos desejos, eles se impõem pela cultura.

Um materialista dialético, como Marx, faz uma descrição até elegante do homem, mas delimita-o em função de sua crença de que tudo o que lhe diz respeito é-lhe imanente, não havendo necessidade de nenhum pensamento sobre o transcendente para compreendê-lo. Marx reconhece o homem material e, ao mesmo tempo espiritual, mas limitando o próprio espírito como uma espécie de energia que flui da matéria e que só atua enquanto o homem vive em comunidade. Sua visão é quase, senão totalmente, budista.

Há, também, uma visão do homem como sendo constituído de um corpo que dá suporte ao espírito, com intermediação da alma. Os que assim pensam, muitas vezes não conseguem distinguir alma de espírito, ficando confusos quando questionados. Entre eles, alguns colocam toda a esperança no espírito que só se realizará além desta vida. Assim, podem manipular os mais fracos e submetê-los a todo tipo de exploração, mediante a esperança de que eles vencerão na outra vida. Marx colocou-se em oposição a esse tipo de abordagem.

Mas há uns poucos que adotam essa segunda visão de forma mais integrada, começando pelo respeito do homem na sua forma corporal e, ainda, lidando com a projeção do mesmo na sua forma espiritual, onde reside sua máxima dignidade. Essa é a postura defendida pela praticantes consequentes de quase todas as religiões e, em particular, do cristianismo. Esse era o ponto de vista de alguns importantes filósofos, entre os quais Sócrates e Platão.

Os seguidores do Bhagavad Gita também adotam esse último ponto de vista, fundindo sua religião com sua filosofia. Entre eles citam-se Ghandi, que também aceitava o princípio cristão expresso o Sermão do Monte, e Paramahansa Yogananda, que tentava fazer a conexão entre o cristianismo e o hinduismo descrito no Bhagavad Gita. Eles aceitavam o valor de todas as religiões basedas no amor e, como consequência, o respeito pela condição humana em sua realidade socio-cultural.

O diálogo que leva em conta a diversidade, tendo como pano de fundo a essência do homem, gerou a  Declaração dos Direitos Humanos. Nela, que não foi endossada pela Igreja Católica Apostólica Romana, destacam-se: a liberdade, a igualdade e a justiça. Nisso, tangencia-se o imanente com o transcendente, deixando que cada um siga o seu próprio caminho quanto à sua crença na essência última do homem. Esse caminho foi conquistado com sangue, suor e lágrimas, e parece ser um consenso capaz de estabelecer uma linguagem comum a todos os homens.

Nessa busca pela essência do homem, em última análise prevalece a fé. Não há como ter outra perspectiva, pois a própria vida tem, sem si, uma fé embutida. E cada indivíduo, de acordo com as suas próprias condições de existência, tem sua própria fé. Esta, eventualmente, é passível de mudança em função das experiências particulares.

Em última instância, creio que a essência comum a todos os homens é a liberdade de consciência como possibilidade. Quem se abdica dessa liberdade abdica-se de sua própria essência humana.